Há 70 anos entrava no ar o REPÓRTER ESSO

No ar, o Repórter Esso, testemunha ocular da história!
O mais famoso noticiário de todos os tempos, o Repórter Esso, estreou no rádio há 70 anos, no dia 28 de agosto de 1941. Foi o primeiro noticiário de radiojornalismo do Brasil, comandado pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Patrocinado pela empresa norte-americana sediada no Brasil, Standard Oil Company of Brazil, o Repórter Esso se especializou em divulgar, principalmente, notícias sobre a evolução das guerras travadas pelos Estados Unidos em todo o mundo.

O Repórter Esso (também conhecido como O Seu Repórter Esso) foi um noticiário histórico do rádio e da televisão brasileira.
Foi o primeiro noticiário de radiojornalismo do Brasil que não se limitava a ler as notícias recortadas dos jornais, pois as matérias eram enviadas por uma agência internacional de notícias sob o controle dos Estados Unidos da América.

Os locutores que fizeram maior sucesso no noticioso foram: Heron Domingues, Luiz Jatobá e Gontijo Teodoro. 
Os slogans mais famosos eram: 
O Primeiro a Dar as Últimas
Testemunha Ocular da História.
O programa radiofônico trouxe para o radiojornalismo brasileiro, a informação por ele divulgada não era apenas notícia, mas se constituía, também, em informação dirigida, em propaganda político-ideológica, produzindo e construindo sentido e com alvo certo: o governo e determinados segmentos da sociedade brasileira. 
A primeira transmissão ocorreu na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, em 28 de agosto de 1941, iniciando a cobertura do Brasil na Segunda Guerra Mundial.

Antes da estreia oficial, o programa havia ido ao ar experimentalmente na Rádio Farroupilha de Porto Alegre.

Na televisão, o noticiário, inicialmente com o nome de O Seu Repórter Esso, foi apresentado de 10 de abril de 1952 até 31 de dezembro de 1970 na TV Tupi.

Getúlio Vargas.
O programa inicialmente foi criado para fazer a propaganda da guerra americana direcionada ao povo brasileiro. Iniciou sua atividade em 1941 apoiado pelo presidente Getúlio Vargas e sob a orientação do Departamento de Imprensa e Propaganda, o DIP.

O Repórter Esso foi um dos primeiros sintomas da globalização das comunicações: o pacote cultural-ideológico dos Estados Unidos incluía em suas várias edições diárias, uma síntese noticiosa de cinco minutos rigidamente cronometrados, a primeira de caráter global, transmitido em 14 países do continente americano por 59 estações de rádio, constituindo-se na mais ampla rede radiofônica mundial.

O Repórter Esso se especializou em divulgar principalmente notícias ligadas ao modo de vida americana da época, conhecida como 'American way of life'. Os informes traziam ainda aos ouvintes a evolução das guerras travadas pelos Estados Unidos em todas as partes do planeta.

Realizou ampla cobertura da Guerra da Coréia em 1950, enviando correspondentes para o campo de batalha.
Além das guerras, o programa radiofônico dava bastante ênfase às notícias de autoridades, notáveis, estrelas e astros de cinema e feitos científicos norte-americanos. O Repórter Esso não informava notícias da Europa, da Ásia e da África se não houvesse interesses norte-americanos envolvidos.
Em 1955 noticiou, antes de todos, a morte de Carmem Miranda.
Em 1957, informou com grande ênfase a explosão da Bomba de Hidrogênio. Em 1959 informou que Fidel Castro vencera a Revolução Cubana reforçando o avanço do perigo comunista na América Latina.

O último Repórter Esso
O Repórter Esso terminou suas transmissões em 31 de dezembro de 1968.
Na última edição, transmitida pela Rádio Nacional e pela Rádio Globo do Rio de Janeiro, a partir das 20:25 da noite, o radialista Guilherme de Sousa fez a identificação da emissora e dando a hora certa, antes de anunciar: "Alô, alô, Reporter Esso! Alô!"
Assista ao vídeo sobre o Repórter Esso, trabalho da disciplina da história do jornalismo brasileiro do curso de Comunicação Social - Jornalismo da UFC.
Ao som das tradicionais trombetas, o locutor Roberto Figueiredo entrou no ar, noticiando sobre as festividades do ano novo (1969); o pronunciamento do presidente Costa e Silva sobre o momento nacional e a instituição do AI-5, além do mesmo assinar decretos sobre o setor financeiro; a condenação de Israel por parte das Nações Unidas pelo atentado contra o Líbano; a Missa de Ano Novo realizada pelo Papa Paulo VI; a previsão do tempo nas principais cidades do país; e as principais notícias dadas pelo Repórter Esso em 27 anos de atividade.
Durante a leitura desta última, Roberto Figueiredo começou a chorar e se emocionar, chegando a um ponto em que o locutor reserva Plácido Ribeiro, que estava no estúdio na hora do noticiário, seguiu a leitura. Roberto tentou se recompor e, aos prantos, encerrou o último Repórter Esso, desejando uma boa noite e um feliz ano novo.
O último Repórter Esso no Rádio, em 31 de dezembro de 1968.
Na televisão, o noticiário foi apresentado pela última vez em 31 de dezembro de 1970 na TV Tupi e na TV Record.

Personagens que fizeram a história no Repórter Esso:

Heron de Lima Domingues
Heron Domingues nasceu em São Gabriel, Rio Grande do Sul ,em 04 de junho de 1924.
Aos 16 anos tentou a carreira de cantor e foi participar em um concurso de calouros na Rádio Gaúcha, em Porto Alegre a 7 dezembro de 1941, dia escolhido pelos japoneses para bombardear Pearl Harbour, Havaí nos Estados Unidos.
Na ausência do locutor da rádio, Domingues foi lançado às pressas aos microfones e deu a notícia em primeira mão. Não participou do concurso, mas saiu da rádio empregado.
Em 1944, mudou-se para o Rio de Janeiro e passou a trabalhar na Rádio Nacional, onde, no programa Repórter Esso, transmitia a informação "como se estivesse numa trincheira", costumava dizer.
Acampado no estúdio da carioca Rádio Nacional, Heron Domingues, o Repórter Esso , aguardava sôfrego pelo telegrama que confirmaria o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Deveria fazer jus ao apelido a ele atribuído, "o primeiro a dar as últimas".

Após passar Natal, Ano-Novo e Páscoa em alerta, os colegas insistiam para que ele fosse descansar em casa. Aceitou o conselho a contragosto e, para sua decepção, foi em casa que o radialista soube do fim do armistício, pela emissora concorrente. Para consolo, sua credibilidade ressoou: "Se o Repórter Esso ainda não deu, não deve ser verdade", comentava-se pelo País. Só depois que empostou sua inconfundível voz ao microfone é que a notícia ganhou veracidade.
Na televisão, trabalhou na extinta TV Rio, onde apresentou o Telejornal Pirelli, ao lado de Léo Batista e na Rede Globo, onde apresentou o Jornal da Noite e o Jornal Internacional na Globo de 1971 até 1974.

Em tom alarmista, o radialista foi o primeiro a noticiar vários fatos históricos nos 33 anos de carreira: o lançamento da bomba atômica sobre Hiroshima - (1945): o suicídio de Getúlio Vargas - (1954), a morte da cantora Carmen Miranda - 1955; a renúncia do presidente da República Jânio Quadros - (1961), a chegada do Homem à Lua - (1969).
Ouça o Repórter Esso - Heron Domingues anuncia a morte de Hitler e o fim da 2ª Guerra Mundial no dia 7 de maio de 1945


Heron Domingues acreditava que a voz era dádiva de Deus e não se preocupava em preservá-la. Boêmio, bebia e fumava em excesso. Depois do expediente, era comum lotar a casa de amigos para notívagos bate-papos. Quando as visitas partiam, virava-se para a esposa, a jornalista Jacyra Domingues, e dizia: "Já faz muito tempo que estou em casa, vamos sair para dançar".
Foi o primeiro apresentador de televisão, quando ingressou na TV Tupi do Rio de Janeiro, em 1961. Desde 1972, estava na TV Globo, (Rede Globo), do Rio de Janeiro.
Eron Domingues também foi apresentador de televisão.
Eufórico para anunciar com exclusividade o impeachment do ex-presidente norte-americano Richard Nixon, no extinto Jornal Internacional, da TV Globo, sem imaginar que seria seu último noticiário. Poucas horas depois foi jantar com os amigos, tendo tido um infarto fulminante já em casa. Os amigos acreditam que Domingues foi vencido pela emoção.

"Trabalhei no Repórter Esso de 1944 a 1962, sem um dia de folga. Levantava-me ás 6:45 hs. e voltava para casa à 1:30 da madrugada. Nos períodos críticos, dormia na rádio, que tinha uma cama na redação. 

Para se ter uma idéia da época conturbada em que vivíamos, no período em que fui locutor do Esso, houve no Brasil dez presidentes da república. Durante a guerra, dormia na Rádio Nacional com um fone no ouvido, diretamente ligado a UPI. Sempre que havia uma notícia importante, eles me despertavam, eu mesmo colocava a emissora no ar e transmitia a notícia. 

Para o fim da guerra, preparamos uma audição especial do Repórter Esso, em que a notícia seria dada fundida com o repicar de sinos. Com medo de me emocionar muito diante do microfone, gravei o início da transmissão: "Atenção! Atenção! Acabou a guerra"  (Heron Domingues).

Uma equipe médica estudou a voz de Domingues por dez anos e nenhuma alteração foi observada, um fenômeno. "Bebo e fumo em excesso", disse ele. "Pois continue bebendo e fumando", aconselharam os médicos.
Heron Domingues faleceu em 9 de agosto de 1974, no Rio de Janeiro, após um dia de trabalho. Teve um ataque cardíaco. Ele era casado com a jornalista Jacyra Domingues.

Luiz Jatobá
Luiz Jatobá foi dono de uma das mais belas vozes da locução e narração no rádio, cinema e televisão durante cerca de 45 anos. Desinibido e incentivado por uma namorada, inscreveu-se e ganhou um concurso para locutores vinculado no Jornal do Brasil (1935), que inaugurava a sua emissora. Foi escalado para programa em que selecionava discos clássicos e fazia comentários. Paralelamente a este emprego, estudava Medicina Ortopédica, e após formar-se, foi fazer pós-graduação nos Estados Unidos. De volta ao Brasil, passou a escrever reportagens para jornais cariocas e para a revista Manchete e apresentava o programa "A Hora do Brasil".
Foi para o EUA e como contratado da Columbia Broadcasting System, a CBS, em Nova York, tornou-se correspondente para o Brasil de notícias sobre a Segunda Guerra, e apresentador de traillers cinematográficos para a Metro Goldwin Mayer. No Brasil tornou-se (1950) o apresentador do primeiro noticiário da televisão brasileira, o Repórter Esso, na TV Tupi do Rio.
Foi para a Rádio Mayrink Veiga (1951), atuando como apresentador de programas e também na Rádio Nacional (1958-1960). Participou de programas na TV Excelsior, foi para a TV Globo (1969) e, três anos depois, voltou aos Estados Unidos, onde trabalhou novamente como narrador de traillers cinematográficos para a Columbia, a Paramount, a Universal Pictures, e a United States Information Agency.
Faleceu em 1982 em Nova Iorque, aos 67 anos.

Kalil Filho
Kalil foi o primeiro Repórter Esso da TV no Brasil e em São Paulo, na época, o noticiário mais famoso da TV Tupi.
Kalil Filho foi contratado pela TV Excelsior em 1964 quando daquela febre de contratações que o Grupo Bozzano Simonsen (proprietário da TV Excelsior) fez na TV, desbancando a Tupi de ser a emissora que liderava o Ibope na época.
Na TV Excelsior Kalil também fazia um telejornal, sua especialidade. Foi diretor astístico, e devido a um 'traira', (que ele chamava de gansterzinho), teve uma briga com a direção da TV e saiu. Foi trabalhar na Rádio Bandeirantes onde apresentava o 'Reporter Sucesso'.
Em 1967 foi trabalhar nas Organizações Globo (ainda não a poderosa Rede Globo) onde foi fazer um programa na Rádio Excelcior, que fazia parte das Organizações Victor Costa que tinha sido comprada por Roberto Marinho.
Seu nome era Munir Mieli Kalil, filho de José Jorge Kalil e dona Itália Mieli.
Kalil Filho nasceu em 2 de dezembro de 1930 e faleceu em 13 de abril de 1970, num acidente na Marginal Pinheiros em São Paulo.

Gontijo Teodoro
Gontijo Teodoro ficou famoso por comandar o popular “Repórter Esso”, programa que marcou época na televisão brasileira.
A célebre frase “amigos ouvintes, aqui fala seu Repórter Esso, testemunha ocular da história”, sempre acompanhada por uma das vinhetas musicais mais conhecidas da história da TV brasileira, anunciou, durante 17 anos, o início das edições do telejornal que teve como um de seus símbolos Gontijo Teodoro. O apresentador comandou o programa entre 1953 e 1970, na extinta TV Tupi.
Na telinha, “Repórter Esso” repetiu o sucesso que alcançara no rádio brasileiro, na década de 40, apresentado pelo locutor Heron Domingues.
Gontijo Teodoro morreu aos 78 anos de idade, vítima de enfarto, no Rio de Janeiro.

6 DE AGOSTO: 101 ANOS DE ADONIRAN BARBOSA

SE O SENHOR NÃO TÁ LEMBRADO....
A Rádio na Internet apresenta um Especial com o cantor e compositor Adoniran Barbosa, comemorando os seus 101 anos de nascimento.  
Ouça neste domingo na Rádio na Internet uma programação especial com músicas do genial Adoniran Barbosa.
Adoniran Barbosa nasceu João Rubinato, em 06 de agosto de 1910, em Valinhos, SP. 
Foi um colecionador nato de apelidos. Seu verdadeiro nome era João Rubinato - mas cada situação por ele vivida o transformava num novo personagem numa nova história.

Ele nos conta a vida de um típico paulistano, filho de imigrantes italianos, a sobrevivência do paulistano comum numa metrópole que corre, range e solta fumaça por suas ventas. Através de suas músicas, canta passagens dessa vida sofrida, miserável, juntando o paradoxo bom humor / realidade - para quê lamúrias?


Tirou de seu dia a dia a idéia e os personagens de suas músicas. Iracema nasceu de uma notícia de jornal - quando uma mulher havia sido atropelada na Avenida São João.



Adoniran nasceu e morreu pobre - todo o dinheiro que ganhou gastou ajudando ou comemorando sucessos com os amigos - seu combustível era a realidade - porque então querer viver fora dela? Talvez soubesse que o valor maior de suas canções eram interpretações como a de Elis ou Clara Nunes.

Foi um grande colecionador de amigos, com seu jeito simples de fala rouca, contador nato de histórias, conquistava o pessoal do bairro, dos freqüentadores dos botecos onde se sentava para compor o que os cariocas reverenciaram como o único verdadeiro samba de São Paulo. Mais do que sambista, Adoniran foi o cantor da integridade.


Foi um compositor, cantor, humorista e ator brasileiro. João Rubinato representava em programas de rádio diversos personagens, entre os quais, Adoniran Barbosa, o qual acabou por se confundir com seu criador dada a sua popularidade frente aos demais. Adoniran ficou conhecido nacionalmente como o pai do samba paulista.

Rubinato era filho de Ferdinando e Emma Rubinato, imigrantes italianos da localidade de Cavárzere, província de Veneza. Aos dez anos de idade, sua certidão de nascimento foi adulterada para que o ano de nascimento constasse como 1910 possibilitando que ele trabalhasse de forma legalizada: à época a idade mínima para poder trabalhar era de doze anos.


Abandonou a escola cedo, pois não gostava de estudar. Necessitava trabalhar para ajudar a família numerosa - Adoniran tinha sete irmãos. Procurando resolver seus problemas financeiros, os Rubinato viviam mudando de cidade. Moravam primeiro em Valinhos, depois Jundiaí, Santo André e finalmente São Paulo.


Em Jundiaí, Adoniran conhece seu primeiro ofício: entregador de marmitas. Aos quatorze anos, ainda criança, o encontramos rodando pelas ruas da cidade e, legitimamente, surrupiando alguns bolinhos pelo caminho. "A matemática da vida lhe dá o que a escola deixou de ensinar: uma lógica irrefutável. Se havia fome e, na marmita oito bolinhos, dois lhe saciariam a fome e seis a dos clientes; se quatro, um a três; se dois, um a um".



O compositor e cantor tem um longo aprendizado, num arco que vai do marmiteiro às frustrações causadas pela rejeição de seu talento. Quer ser artista – escolhe a carreira de ator. Procura de várias maneiras fazer seu sonho acontecer. Tenta, antes do advento do rádio, o palco, mas é sempre rejeitado. Sem padrinhos e sem instrução adequada, o ingresso nos teatros como ator lhe é para sempre abortado. 

O samba, no início da carreira, tem para ele caráter acidental. Escolado pela vida, sabia que o estrelato e o bom sucesso econômico só seriam alcançados na veiculação de seu nome na caixa de ressonância popular que era o rádio.


O magistral período das rádios, também no Brasil, criou diversas modas, mexeu com os costumes, inventou a participação popular – no mais das vezes, dirigida e didática. Têm elas um poder e extensão pouco comuns para um país rural como o nosso. Inventam a cidade, popularizam o emprego industrial e acendem os desejos de migração interna e de fama. 

Enfim, no país dos bacharéis, médicos e párocos de aldeia, a ascensão social busca outros caminhos e pode-se já sonhar com a meteórica carreira de sucesso que as rádios produzem. Três caminhos podem ser trilhados: o de ator, o de cantor ou o de locutor.

Adoniran, aprendiz das ruas, percebe as possibilidades que se abrem a seu talento. Quer ser ator, popularizar seu nome e ganhar algum dinheiro, mas a rejeição anterior o leva a outros caminhos. Sua inclinação natural no mundo da música é a composição mas, nesse momento, o compositor é um mero instrumento de trabalho para os cantores, que compram a parceria e, com ela, fazem nome e dinheiro. 

Daí sua escolha recair não sobre a composição, mas sobre a interpretação.
Entrega-se ao mundo da música. Busca conquistar seu espaço como cantor – tem boa voz, poderia tentar os diversos programas de calouro. 

Já com o nome de Adoniran Barbosa – tomado emprestado a um companheiro de boêmia e de Luiz Barbosa, cantor de sambas, que admira – João Rubinato estreia cantando um samba brejeiro de Ismael Silva e Nilton Bastos, o Se você jurar. É gongado, mas insiste e volta novamente ao mesmo programa; agora cantando o belo samba de Noel Rosa, Filosofia, que lhe abre as portas das rádios e ao mesmo tempo serve como mote para suas composições futuras.


A vida profissional de Adoniran Barbosa se desenvolve a partir das interpretações de outros compositores. Embora a composição não o atraia muito, a primeira a ser gravada é Dona Boa, na voz de Raul Torres. Depois grava em disco 'Agora pode chorar', que não faz sucesso algum. 

Aos poucos se entrega ao papel de ator radiofônico; a criação de diversos tipos populares e a interpretação que deles faz, em programas escritos por Osvaldo Moles, fazem do sambista um homem de relativo sucesso. Embora impagáveis, esses programas não conseguem segurar por muito tempo ainda o compositor que teima em aparecer em Adoniran. 

Entretanto, é a partir desses programas que o grande sambista encontra a medida exata de seu talento, em que a soma das experiências vividas e da observação acurada dá ao país um dos seus maiores e mais sensíveis intérpretes.

O mergulho que o sambista fará na linguagem, suas construções linguísticas, pontuadas pela escolha exata do ritmo da fala paulistana, irão na contramão da própria história do samba. Os sambistas sempre procuraram dignificar sua arte com um tom sublime, o emprego da segunda pessoa, o tom elevado das letras, que sublimavam a origem miserável da maioria, e funcionavam como a busca da inserção social. 

Tudo era uma necessidade urgente, pois as oportunidades de ascensão social eram nenhumas e o conceito da malandragem vigia de modo coercitivo. Assim, movidos pelos mesmos desejos que tinha Adoniran de se tornar intérprete e não compositor, e a partir daí conhecido, os compositores de samba, entre uma parceria vendida aqui e outra ali, davam o testemunho da importância que a linguagem assumia como veículo social.



Mas a escolha de Adoniran é outra, seu mergulho também outro. Aproveitando-se da linguagem popular paulistana – de resto do próprio país – as músicas dele são o retrato exato desta linguagem e, como a linguagem determina o próprio discurso, os tipos humanos que surgem deste discurso representam um dos painéis mais importantes da cidadania brasileira. 

Os despejados das favelas, os engraxates, a mulher submissa que se revolta e abandona a casa, o homem solitário, social e existencialmente solitário, estão intactos nas criações de Adoniran, no humor com que descreve as cenas do cotidiano. 

A tragédia da exclusão social dos sambistas se revela como a tragicômica cena de um país que subtrai de seus cidadãos a dignidade.



O seu primeiro sucesso como compositor vira canção obrigatória das rodas de samba, das casas de show: Trem das Onze. É bem possível que todo brasileiro conheça, senão a música inteira, ao menos o estribilho, que se torna intemporal. Adoniran alcança, então, o almejado sucesso que, entretanto, dura pouco e não lhe rende mais que uns minguados trocados de direitos autorais. 
A música, que já havia sido gravada pelo autor em 1951 e não fizera sucesso ainda, é regravada novamente pelos “Demônios da Garoa”, conjunto musical de São Paulo (a cidade era conhecida como a terra da garoa, da neblina, daí o nome do grupo). Embora o conjunto seja paulista, a música acontece primeiramente no Rio de Janeiro. E aí sim, o sucesso é retumbante.

Arguto observador das atividades humanas, sabe também que o público não se contenta apenas com o drama das pessoas desvalidas e solitárias; é necessário que se dê a este público uma dose de humor, mesmo que amargo. Compõe para esse público um dos seus sambas mais notáveis, um dos primeiros em que trabalhou a nova estética do samba.

Entre a tentativa de carreira nas rádios paulistas e o primeiro sucesso, Adoniran trabalha duro, casa-se duas vezes e frequenta, como boêmio, a noite. Nas idas e vindas de sua carreira tem de vencer várias dificuldades. 
O trabalho nas rádios brasileiras é pouco reconhecido e financeiramente instável, muitos passaram anos nos seus corredores e tiveram um fim de vida melancólico e miserável. O veículo que encanta multidões, que faz de várias pessoas ídolos é também cruel como a vida; passado o sucesso que, para muitos, é apenas nominal, o ostracismo e a ausência de amparo legal levam cantores, compositores e atores a uma situação de impensável penúria.
Adoniran sabe disto, mas mesmo assim seu desejo cala mais fundo. 

O primeiro casamento não dura um ano; o segundo, a vida toda: Matilde. De grande importância na vida do sambista, Matilde sabe com quem convive e não só prestigia sua carreira como o incentiva a ser quem é e como é, boêmio, incerto e em constante dificuldade. Trabalha também fora e ajuda o sambista nos momentos difíceis, que são constantes. Adoniran vive para o rádio, para a boêmia e para Matilde.

Numa de suas noitadas, de fogo, perde a chave de casa e não há outro jeito senão acordar Matilde, que se aborrece. O dia seguinte foi repleto de discussão. Mas Adoniran é compositor e dando por encerrado o episódio, compõe o samba Joga a chave.

Dono de um repertório variado de histórias, o sambista não perdia a vez de uma boa blague. Certa vez, quando trabalhava na rádio Record, onde ficou por mais de trinta anos, resolveu, após muito tempo ali, pedir um aumento. O responsável pela gravadora disse-lhe que iria estudar o aumento e que Adoniran voltasse em uma semana para saber dos resultados do estudo... quando voltou, obteve a resposta de que seu caso estava sendo estudado. As interpelações e respostas, sempre as mesmas, duraram algumas semanas... Adoniran começava se irritar e, na última entrevista, saiu-se com esta: “Tá certo, o senhor continue estudando e quando chegar a época da sua formatura me avise..”


Nos últimos anos de vida, com o enfisema avançando, e a impossibilidade de sair de casa pela noite, o sambista dedica-se a recriar alguns dos espaços mágicos que percorreu na vida. Grava algumas músicas ainda, mas com dificuldade – a respiração e o cansaço não lhe permitem muita coisa mais – dá depoimentos importantes, reavaliando sua trajetória artística. Compõe pouco.


Mas inventa para si uma pequena arte, com pedaços velhos de lata, de madeira, movidos a eletricidade. São rodas-gigante, trens de ferro, carrosséis. Vários e pequenos objetos da ourivesaria popular – enfeites, cigarreiras, bibelôs... Fiel até o fim à sua escolha, às observações que colhe do cotidiano, cria um mundo mágico. Quando recebe alguma visita em casa, que se admira com os objetos criados pelo sambista, ouve dele que “alguns chamavam aquilo de higiene mental, mas que não passava de higiene de débil mental...” 

Como se vê, cultiva o humor como marca registrada. Marca aliás, que aliada à observação da linguagem e dos fatos trágicos do cotidiano, faz dele um sambista tradicional e inovador.
Adoniran Barbosa morreu em 1982, aos 72 anos de idade.

Discografia

1951 - "Os mimosos colibris/Saudade da maloca" (78 rpm)
1952 - "Samba do Arnesto/Conselho de mulher" (78 rpm)
1955 - "Saudosa maloca/Samba do Arnesto" (78 rpm)
1958 - "Pra que chorar" (78 rpm)
1958 - "Pafunça/Nois não os bleque tais" (78 rpm)
HS/D Music - "Aqui Gerarda!/Juro, amor!" (78 rpm)
1972 - "A Música Brasileira Deste Século -Adoniran Barbosa"
1974 - "Adoniran Barbosa"
1975 - "Adoniran Barbosa"
1979 - "Seu Último Show" (Ao Vivo)
1980 - "Adoniran Barbosa e Convidados"
1984 - "Documento Inédito"
2003 - "2 LPs em 1" (Re-lançamento dos LPs de 1974 e 1975)
[editar]Coletâneas
1990 - "Claudinha Do céu" (Com interpretes de suas músicas)
1996 - "MPB Compositores: Adoniran Barbosa" (Com participações e interpretes de suas músicas)
1999 - "Meus Momentos: Adoniran Barbosa"
1999 - "Raízes do Samba: Adoniran Barbosa"
2001 - "Para Sempre - Adoniran Barbosa"
2002 - "Identidade: Adoniran Barbosa"
2004 - "O Talento de: Adoniran Barbosa" (Com participações especiais)
[editar]Video
1972 - "Programa Ensaio: Adoniran Barbosa"
[editar]Principais Musicas
Malvina, 1951
Saudosa maloca, 1951
Joga a chave, 1952
Samba do Arnesto, 1953
As mariposas, 1955
Iracema, 1956
Apaga o fogo Mané, 1956
Bom-dia tristeza, 1958
Abrigo de vagabundo, 1959
No morro da Casa Verde, 1959
Prova de carinho, 1960
Tiro ao Álvaro, 1960
Luz da light, 1964
Trem das Onze, 1964
Trem das Onze com Demônios da Garoa, 1964
Aguenta a mão, 1965
Samba italiano, 1965
Tocar na banda, 1965
Pafunça, 1965
O casamento do Moacir, 1967
Mulher, patrão e cachaça, 1968
Vila Esperança, 1968
Despejo na favela, 1969
Fica mais um pouco, amor, 1975
Acende o candeeiro, 1972
[editar]Filmografia
1953 - "O Cangaceiro"
1954 - " Candinho"
1955 - "A Carrocinha"